Não incidência de Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) sobre a transferência de cotas de fundo de investimento fechado, no contexto de herança.
- MKTSP
- 20 de ago. de 2024
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Por: Alexandre Pontes
A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) proferiu decisão estabelecendo que não incide Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) sobre a transferência de cotas de fundo de investimento fechado, no contexto de herança. Tal decisão ocorreu em um caso específico envolvendo a transferência de um patrimônio avaliado em R$ 7,5 bilhões, pertencente ao falecido médico e empresário Edson de Godoy Bueno, fundador da Amil, cujas cotas foram transferidas a seus herdeiros, Pedro de Godoy Bueno e Camilla de Godoy Bueno Grossi, após o falecimento do empresário em fevereiro de 2017.
Por unanimidade, os ministros reformaram uma decisão anterior proferida pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3), sediado em São Paulo, favorecendo assim os contribuintes. Este julgamento é inédito, sendo a primeira vez que uma turma do STJ se manifesta sobre o assunto.
A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) sustentou que o Imposto de Renda deveria incidir sobre a diferença entre o valor de mercado das cotas transferidas e o valor constante na última declaração de Imposto de Renda da pessoa falecida, argumentando que tal transferência constituiria ganho de capital. Em contrapartida, os herdeiros argumentaram que não houve lucro ou ganho, já que receberam as cotas pelo valor declarado pelo falecido, defendendo que a tributação deveria ocorrer apenas no momento da venda ou resgate das cotas.
A decisão do STJ contraria o entendimento recente da Receita Federal, expresso na Solução de Consulta da Coordenação Geral de Tributação (não incide Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) sobre a transferência de cotas de fundo de investimento fechado, no contexto de herança.) nº 21/2024, que determinou que, em situações similares, deve-se apurar ganho de capital seguindo as regras aplicáveis à alienação de bens. Entretanto, a decisão do STJ prevalece sobre o entendimento administrativo da Receita Federal.
O relator do caso, ministro Gurgel de Faria, ressaltou que o artigo 23 da Lei nº 9.532/1997 permite que a transferência de bens por herança ou doação seja feita tanto pelo valor de mercado quanto pelo valor declarado nos bens do falecido ou doador. Ele enfatizou que a transferência de bens por sucessão é legalmente prevista e que a Receita Federal não possui a prerrogativa de criar novas hipóteses de tributação pelo Imposto de Renda quando não há um ganho de capital configurado.
Os ministros da Primeira Turma concordaram que o imposto não incide no ato de transferência de titularidade das cotas, mas apenas quando ocorrer o resgate ou alienação efetiva das mesmas, ou ainda, se a transferência for realizada pelo valor de mercado e houver diferença positiva em relação ao valor de aquisição. Eles sublinharam que a transferência legítima de cotas para os herdeiros representa meramente uma atualização cadastral perante a instituição financeira, não configurando, por si só, fato gerador de tributação.
O advogado dos herdeiros argumentou que a controvérsia diz respeito ao momento apropriado para a incidência tributária, se na transferência de titularidade ou no resgate efetivo das cotas, conforme o que dispõe a legislação. Ele também observou que os fundos de investimento fechados possuem regras específicas, que restringem o resgate das cotas antes do término do prazo de duração do fundo, o que impede a tributação sobre resultados parciais.
Por outro lado, o procurador da Fazenda Nacional, Euclides Sigoli Júnior, defendeu que a transmissão das cotas configura uma forma de alienação para fins de incidência do IRRF, nos termos do artigo 65 da Lei nº 8.981/1995. Ele argumentou que não haveria fundamento para postergar a incidência do tributo, alertando que tal interpretação beneficiaria os indivíduos mais ricos, possibilitando estratégias de proteção patrimonial que agravariam a regressividade da carga tributária no Brasil.
Conforme relatado pelo portal de notícias "jota.info", os ministros da Primeira Turma do STJ, ao julgar o Recurso Especial nº 1.968.695, firmaram entendimento de que não há incidência de Imposto de Renda sobre a transferência de cotas de fundo de investimento fechado para herdeiros, visto que a operação não configura ganho de capital quando realizada pelo valor declarado na última declaração de bens do falecido.
De acordo com matéria publicada pelo "Valor Econômico" em 14 de agosto de 2024, o STJ, ao afastar a incidência do IRPF na referida transferência, reafirmou que o Imposto de Renda só é devido no caso de resgate ou alienação das cotas, ou quando a transferência ocorre pelo valor de mercado com apuração de ganho de capital.
Este precedente, que contraria a interpretação adotada pela Receita Federal na Solução de Consulta Cosit nº 21/2024, possui o potencial de influenciar futuras discussões e casos análogos sobre o tema, embora a Receita Federal não esteja vinculada a esta decisão. Todavia, é esperado que o entendimento firmado pelo STJ prevaleça em litígios correlatos, podendo impactar a jurisprudência e a prática tributária no país.
A Equipe de Consultoria Tributária do C&M Advisors esta a disposição para esclarecer dúvidas pertinentes ao assunto deste artigo e outros.
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